Deolinda Marques: Venci a Covid-19

Deolinda Marques: Venci a Covid-19

Foto: Reprodução /

HOSPITALIZAÇÃO

Que
SUS
to!
(Ozildo Batista de Barros)
Começo esse artigo com o poema do meu amigo Ozildo Batista que, com sua imensa capacidade de síntese poética, resumiu tão bem essa experiência vivida por mim: Que SUS to!
Prestes a completar 62 anos de idade, vivi o que, talvez, tenha sido a maior experiência pessoal da minha vida.

Desde março, quando a humanidade tomou conhecimento estarrecida desse vírus avassalador que começa destruir o mundo – NOVO CORONAVÍRUS –, não tive dúvidas de que ele era realmente muito potente e que todos nós deveríamos nos cuidar e tentar nos proteger ao máximo. 

Iniciei o isolamento social, sendo que a última vez que fui a Picos para eventos sociais foi dia 14 de março, quando comemoramos o Dia Nacional da Poesia. Ocupando a Presidência da Academia de Letras da Região de Picos – ALERP, suspendi todas as nossas atividades, inclusive o processo eleitoral da Cadeira Nº 17, que fora ocupada pelo saudoso professor e poeta Inácio Baldoíno.  Passamos a nos reunir apenas através das plataformas digitais e, mesmo assim, ainda passamos pelo dissabor de perder dois dos nossos confrades: os poetas Jurdan Gomes e Chico de Júlio (sendo este último pra COVID).

Passei a conviver apenas com as pessoas da minha família, adotei todas as medidas de precaução indicadas pelas autoridades em Saúde, como higienização constante das mãos, uso de máscaras e álcool em gel... Ainda em pânico, relembrei muito a Epidemia de 1918, sobre a qual publiquei o artigo “Memórias da Gripe Espanhola”, relatando a experiência traumática vivida e tantas vezes relatada pela minha avó Deolinda, que, em dezembro daquele ano, perdeu o pai e mãe no período de oito dias. Mas tinha esperanças de que tudo fosse bem mais rápido e menos danoso, tendo em vista os avanços da Medicina e estarmos em outro contexto de pessoas muito mais conscientes. Em maio, comecei a sentir o peso do Isolamento e escrevi o poema “Banzomia”, falando da tristeza que afetava a alma. Quantas morte, quantas perdas, meu Deus!

Chegou final de novembro, começam as discussões sobre a vacina e eu já me considerava uma pessoa livre da COVID -19. Mas, para minha surpresa, comecei a sentir os primeiros sintomas dia 25 de novembro e não tive dúvidas que tinha contraído o tal vírus. O que senti, embora considerasse sintomas leves, nunca havia sentido antes: estado febril, dores no corpo, forte dor de cabeça e zumbido nos ouvidos. Isolei-me na casa de uma irmã, que já estava curada da COVID, para proteger minha mãe que tem 83 anos. Dia 30, fiz o teste (SWAB), que deu positivo, e passei a ser acompanhada pelo médico (em Bocaina), que me receitou o medicamento do protocolo inicial. Logo depois, perdi o olfato e o paladar, mas todos os sintomas continuavam leves; dormia e me alimentava bem e considerava que já estava me livrando da doença. 

Após sete dias do teste, começaram uma tosse seca, um pouco de cansaço e a saturação (que era verificada por meu irmão, todos os dias) começou a baixar muito. O médico sugeriu a Tomografia e, dia 08 de dezembro (na hora da missa da Imaculada Conceição, em Bocaina), fui levada ao Hospital Regional Justino Luz. Lá, fui atendida imediatamente (na área da COVID) e submetida à Tomografia. Antes mesmo do diagnóstico, já recebi o auxílio do Oxigênio e, em seguida, o resultado: 50% do pulmão comprometido, mesmo nunca tendo sido fumante.

Dados os fatores de riscos conhecidos: idade, obesidade e diabetes (e talvez muitos desconhecidos), minha família entrou em pânico e quis me levar imediatamente para Teresina, temendo o tratamento em Picos. Mas colocou nas minhas mãos a decisão final de ir ou fazer o tratamento em Picos.

Lúcida e sensatamente, decidi ficar em Picos, sob protesto de alguns familiares e muitos amigos, e não me arrependi. Tive um tratamento de excelência e vivi a maior experiência particular da minha vida. Eu, que me considerava uma pessoa sadia (nunca tinha tomado um soro), depois de um dia internada, fui levada diretamente para UTI, onde permaneci por três dias, mais dois dias de internação, depois, na Enfermaria. 

Repito: lá tive um tratamento de excelência, fui muito bem cuidada por profissionais novos, competentes e comprometidos. Todo(a)s o(a)s médico(a)s, enfermeiro(a)s, fisioterapeutas, técnico(a)s em enfermagem, nutricionistas (nem posso citar todos, pois desconheço todas as profissões envolvidas naquele brilhante trabalho), empenhados em dar o seu melhor. 

Foi uma experiência muito forte, sobretudo, porque reencontrei muitos ex-alunos, relembrei de quando, há 42 anos, estava iniciando a minha carreira profissional com apenas 20 nos. Com certeza, também desacreditada por muitos, mas pude sentir que meu trabalho, como professora, não foi em vão.

Recebi um carinho especial de todos os profissionais, desde os maqueiros e pessoal da limpeza até os médicos. É complicado citar nomes, mas não poderei deixar de mencionar alguns médicos que me deram atenção absoluta: Bruno Barros, Lucas Cortês, Paulo Moura, Tércio Luz, Álvaro Portela Macêdo, Eduardo Barros, Gilberto Filho, Roberto Carvalho, Rodolfo Carvalho (que esteve a meu lado na UTI) e tantos outros que não os conhecia.

Por várias vezes fiquei extremamente emocionada em ver tantos profissionais competentes e comprometidos. Optei por ficar em Picos e não me arrependi; deu certo, graças a Deus a e ao trabalho e empenho de todos. A máscara de mergulho, adaptada com ventilação não invasiva, a qual fui submetida por 15 horas na UTI (cinco secções, com três horas de duração), segundo me informaram, tem salvado muitas vidas.

Saí de lá com o propósito firme de defender o HOSPITAL REGIONAL JUSTINO LUZ (que é tão criticado) por todos os meios possíveis. Nada a reclamar, só elogios e aplausos (de pé) para todos os profissionais.

Mas também acho que não posso me calar mediante a situação que pude constatar: os profissionais com seus salários atrasados. ISSO É INADMISSÍVEL!

Uma companheira de Enfermaria lá de Paulistana (muito católica) disse que já tinha pedido a todos os parentes para rezarem para os funcionários receberem seus vencimentos. Também sou católica, devota de Nossa Senhora da Conceição, mas sei que não basta rezar. Considero o maior desrespeito que pode existir, e que fere totalmente a dignidade de um trabalhador, é trabalhar e não receber seu salário (na grande maioria das vezes irrisório) no final do mês, principalmente quando se presta tão nobre e perigoso serviço à sociedade. Denuncio esse descaso das autoridades!

Seja de quem for a responsabilidade, Senhor Governador, faça cumprir esse direito. Os profissionais da saúde estão brilhantemente fazendo a parte deles. FAÇAM A DE VOCÊS.
Finalizo com meus aplausos (de pé) para todos os profissionais do HRJL (área da COVID). Vocês merecem!

Deolinda Marques
(Professora aposentada, escritora e Presidente da ALERP)

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