LIVROS, PESSOAS E COISAS
/
<div>O nome de cada pessoa é dado pelos pais, no batismo e depois no cartório. Pouco tem a ver com o que a criança é ou vai ser. Daí se diz acertadamente que <em>“o</em> <em>nome não faz a pessoa, a pessoa é que faz o nome”.</em> No meu entender, a criança não chega a ser uma pessoa: É uma criatura, mais instinto, mais indivíduo que aprende a conviver com os outros, por isto merece o cuidado e o carinho dos adultos. Somente depois de receber aquela carga de hormônios que explode na adolescência – época de tão rápidas transformações – é que a criatura da espécie humana começa a aparecer e afirmar-se em pessoa. </div>
<div>
<p>Já o nome das coisas é diferente. Por isto a língua (as línguas, de modo geral) tem sua grande importância no desenvolvimento e na interpretação da vida e do mundo. Quem dá o nome às coisas, naturalmente encontrou alguma semelhança ou diferença, metáfora ou metonímia, para escolher aquele som ou grupo de sons, ruídos e gestos. Não sei se isto que digo é científico, se pode tornar-se regra geral, mas uma coisa é certa: Quando cursava o ginásio – o curso que se seguia ao primário, ambos de 4 anos – o professor de português, meu mestre Pe. David Ângelo Leal, de saudosa memória, estimulava o conhecimento da Etmologia, origem das palavras. Uma língua vem de outra, a nossa do latim com alguma coisa do grego. Os nomes são paridos por outros nomes, e assim acredito que ocorra na vida da sociedade. Nascemos sentindo e até pensando, quem sabe, mesmo que um pensamento primitivo. Mas ninguém nasce sabendo nem nunca saberá tudo. Uns aprendem com os outros. Exemplos não faltam. Deus vem de <em>teos,</em> <em>adeus </em>vem de <em>Deus</em>, <em>entusiasmo</em> possui em sua raiz a palavra <em>teos</em>, que é o mesmo Deus. Eu, particularmente, creio que a palavra Deus é a mais conhecida e falada no mundo, se computadas todas as línguas. Nesse ponto, contrario o Millor Fernandes quando diz que a palavra mais falada e conhecida do mundo é <em>goal.</em></p>
<p>A esta altura, o leitor já se pergunta impaciente:</p>
</div>
<div>
<p>– Para que este nariz de cera? Por que não diz logo a que veio</p>
<p>Sim, agora é o livro, embora no título tenha vindo em primeiro lugar. Nos idos de 1980, olhando detidamente os livros de uma livraria em Salvador, dei de cara com um de contos, denominado <em>“O menino perdido”.</em> Decepcionei-me e ao mesmo tempo fiquei deslumbrado. De autoria do americano Thomaz Wolfe (não confundir com o Tom Wolf), é um livro de contos que tem por tema o contraste da infância com a vida adulta, profundo e bem escrito. E eu, que tinha começado uma obra com o mesmo título, fiquei perplexo. E agora? Pensei, pensei... E daí, em diante, o meu passou a chamar-se <em>“O menino quase perdido”.</em> Mudei apenas o título, dei continuidade ao trabalho. Não compondo apenas contos, mas outras peças consideradas crônicas e poemas e um pouco de romance, pelo encadear dos fatos e finalização já pegando parte da adolescência. Resultou uma espécie de memorial. Para mim, então falando de fora, porque não posso mais mudar a estrutura e o conteúdo, o meu se aprofunda na infância de um menino pobre, do interior, sem grande espaço para contraposições a outras idades. Não creio em memórias, não escreveria jamais as minhas, mas acredito que toda infância é rica. Nós, grandalhões, jamais vamos entendê-la na sua grandeza, na sua beleza e até na sua bondade. E ficou claro, em meu “<em>O menino quase perdido</em>” que muito do ser da infância me foi revelado, não sei se consegui traduzir em linguagem de poesia e ficção. Mas ficou-me, sim, a convicção de que muito da infância levamos para a vida adulta e nos acompanhará até a sepultura. </p>
</div>
<div><em>Francisco Miguel de Moura – Escritor, membro da Academia Piauiense de Letras – Teresina – Brasil, e da International Writers and Artists Association – Toledo, Estados Unidos das América</em></div>
<div> </div>
<div> </div>