A nudez do poeta

A nudez do poeta

/

<div><strong style="TEXT-ALIGN: justify; FONT-SIZE: 14pt"><span style="FONT-SIZE: 18pt">A nudez do poeta</span></strong></div> <div style=" FONT-SIZE: 14pt"> <div>&nbsp;</div> <div><strong>Admmauro Gommes </strong></div> <div>Poeta e professor de Teoria Liter&aacute;ria da FAMASUL (Palmares/PE)</div> <div>&nbsp;</div> <div>O poema n&atilde;o &eacute; m&aacute;scara que esconda a face de ningu&eacute;m, mesmo que se procure ficar por tr&aacute;s das palavras, h&aacute; de ser revelado nas entrelinhas, um pouco de quem verseja. A obra <em>A nudez de escrever,</em> de Roberto de Queiroz, provoca este entendimento. O autor sugere que o texto o denuncia, mostrando como se &eacute; internamente. Mas quando isso acontece, faz-se, como &eacute; de se esperar, pela for&ccedil;a das met&aacute;foras, o que n&atilde;o diminui a veracidade, pois no que se v&ecirc; percebe-se a exist&ecirc;ncia de certas verdades, ou meias-verdades (que muda tudo).</div> <div>&nbsp;</div> <div>Mesmo assim, ele se exp&otilde;e diante do espelho das letras e surge quase nu de seu sentimento, transparente, mas n&atilde;o todo exposto, como defendem os versos do livro citado (p. 39): <em>&ldquo;Escrever &eacute; se despir/ (si pr&oacute;prio e o sentimento)/ daquilo que h&aacute; no &acirc;mago (...) que se exp&otilde;em ao grafar.&rdquo;</em> Tudo vai muito bem, mas quando ele introduz a palavra &ldquo;&acirc;mago,&rdquo; carregada de ambiguidade, veste-se de novo em seu manto opaco, pois &ldquo;&acirc;mago&rdquo; oculta, indecifra qualquer sentimento, n&atilde;o permitindo que se descubra a l&iacute;mpida realidade. Como quem quer e n&atilde;o quer, finge querer revelar-se, mas, &eacute; &ldquo;fingimento deveras.&rdquo;</div> <div>&nbsp;</div> <div>Ainda que se deixe ocultar entre versos meio obscuros (p. 46): <em>&ldquo;circunspeto &agrave; candura dos lorpas,/ atreve-se a vir &agrave; tona o ub&iacute;quo,&rdquo;</em> o poeta revela sua posi&ccedil;&atilde;o, dentro de uma cr&iacute;tica vis&atilde;o de mundo, bem como o dom&iacute;nio que exerce sobre a linguagem figurada, mas reveladora de identidades. &Eacute; claro que o leitor atento sabe que isso &eacute; um jogo de esconde-esconde e ver um poeta nu, nos termos em que estamos tratando, &eacute; algo que beira a impossibilidade. &Eacute; que o poema, na condi&ccedil;&atilde;o de reflexo do espelho interno do escritor, traduz imagens distorcidas, modificadas, embora verdadeiras na sua ess&ecirc;ncia, no &acirc;mago, por assim dizer. Sem controv&eacute;rsias, todos manipulam a imagem que publicam, nunca negando a verdadeira face, mas investindo no disfarce da pr&oacute;pria realidade vivida ou desejada.</div> <div>&nbsp;</div> <div>Com isso, pode-se afirmar que o poeta, que &eacute; um inventor/ator por natureza, n&atilde;o se permite aparecer de cara limpa em nenhum de seus versos, principalmente nas obras-primas, onde a inven&ccedil;&atilde;o &eacute; regra. Porquanto, h&aacute; um jogo de ideias e sentidos figurados para guardar o que s&oacute; ele sabe e a ningu&eacute;m diz. Por assim dizer, a mimese, que &eacute; a imita&ccedil;&atilde;o por palavras, na literatura, n&atilde;o se configura em copiar a realidade dos fatos, mas mold&aacute;-la ao cunho art&iacute;stico, exigindo que o escritor se vista sempre de uma roupa pelo menos lingu&iacute;stica, invis&iacute;vel aos olhos comuns e sabe que n&atilde;o se pode despir completamente, porque possui alguma caixinha de segredo que n&atilde;o se abre. H&aacute; sempre um tapa-olho nas partes mais &iacute;ntimas da poesia.</div> <div>&nbsp;</div> <div>Para aumentar o disfarce, o autor dialoga com outros poetas, quase que inconscientemente, mas descobre o caminho e provoca a intertextualidade, bem ao gosto dos modernistas, como se atesta em <em>&ldquo;Uma parte de mim &eacute; permanente/ outra parte se sabe de repente&rdquo;</em> de Ferreira Gullar e que Roberto de Queiroz (p. 63) atualiza como <em>&ldquo;Um peda&ccedil;o de mim &eacute; permanente/ outro peda&ccedil;o surge de repente&rdquo;. </em>De quem trata &ldquo;essa parte?&rdquo; De Gullar ou de Queiroz? O certo &eacute; que existe um elemento chamado <em>eu-l&iacute;rico</em> que anula a verdade de ambos e se pronuncia como uma voz dentro do poema que n&atilde;o pertence mais a nudez dos autores, mas a dos leitores quando percebem que a verdade do escritor &eacute; tamb&eacute;m a sua. E quem aparece nu, nessa hist&oacute;ria: o autor ou o leitor?</div> <div>&nbsp;</div> <div>Na verdade, s&oacute; o poeta sabe onde &ldquo;<em>os poemas est&atilde;o prontos sem estar&rdquo;</em> (p. 61) e isso Roberto de Queiroz descobriu h&aacute; muito tempo, desde seu primeiro livro publicado. Agora tenta desnudar-se, mas ainda com muito recato, porque n&atilde;o se mostra por inteiro, mas o que se permite revelar aponta para a grandeza de uma poesia que transita com facilidade entre o verso branco e o tradicional.</div> <div>&nbsp;</div> <div>Vamos ver se da pr&oacute;xima vez ele tira a roupa (sentimento) por completo e se revela nos versos como em carta-aberta aos leitores. Du-vi-de-&oacute;-d&oacute;!</div> </div> <div>&nbsp;</div> <div>&nbsp;</div> <p>&nbsp;</p>
Compartilhe:

Faça seu comentário

Seu endereço de e-mail não será publicado. Os campos marcados são obrigatórios *